26 de jan. de 2011

Biologia reprodutiva de Elaenia cristata em duas áreas de campos rupestres de Minas Gerais

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O gênero Elaenia é um dos mais diversos entre os tiranídeos, com 18 espécies (Stotz et al. 1996). Embora existam descrições de ninhos, ovos, período de incubação, tempo de permanência dos filhotes no ninho e cuidado parental para algumas dessas espécies (Euler 1900, Ihering 1900, Oniki e Willis 1983, de la Peña 1987, 1995, 2005, Belton 1994, Medeiros e Marini 2007), no Brasil tais informações são escassas para Elaenia cristata Pelzeln, 1868. Essa espécie ocorre em quase todo o Brasil e é popularmente denominada guaracava-de-topete (Sick 1997).
Também é encontrada em outros países da América do Sul: Bolívia, Guiana Francesa, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela (Ridgely e Tudor 1994, Stotz et al. 1996). Segundo Ridgely eTudor (1994) E. cristata é a única espécie do gênero típica dos cerrados, ocorrendo menos frequentemente fora dessas formações. É uma espécie comumente encontrada em capoeiras, bordas de mata, áreas abertas (Sick 1997), e é muito comum nos campos rupestres da Serra do Cipó, sendo residente ao longo do ano, onde habita áreas variando entre 800 e 1.350 m de altitude (Melo-Júnior et al. 2001, Guerra 2005, Rodrigues et al.2005).
Observações sobre a dieta de E. cristata são esparsas, sem nenhuma referência à alimentação dos ninhegos pelos adultos. De acordo com Fitzpatrick (1980) a espécie é principalmente insetívora. No entanto Schubart et al. (1965) relatou uma alimentação exclusiva de frutos e Marini e Cavalcanti (1998) encontraram em média 96,5% de frutos em conteúdos estomacais de E. cristata. Em área de campo rupestre E. cristata é primariamente frugívora, apresentando uma dieta composta por 77% de frutos e apenas 23% de artrópodes, indicando essa espécie como frugívora-insetívora e ser tratada como uma importante dispersora de sementes nestes ecossistemas (Guerra 2005).
A espécie apresenta importância biológica e uma carência de informações básicas sobre sua biologia reprodutiva, que é a fonte primária de informações para se propor qualquer programa de manejo e conservação de uma espécie. Desta forma objetivo deste trabalho é apresentar dados adicionais sobre a biologia reprodutiva de E. cristata, como o período reprodutivo, descrição dos ninhos e ovos, período de incubação, tempo de permanência dos filhotes no ninho e cuidado parental.
MATERIAL e MÉTODOS
Área de estudo
O estudo foi conduzido em duas áreas de campos rupestres em Minas Gerais: no Parque Nacional da Serra do Cipó (19°17’S, 43°33’W), município de Santana do Riacho, entre julho e dezembro de 2004 e no Parque Estadual da Serra do Rola Moça (20°03’S, 44°00’W), município de Nova Lima, de julho a dezembro de 2005. Ambas as regiões estão localizadas na porção meridional da Cadeia do Espinhaço. A vegetação é de campos rupestres, sendo composta por árvores baixas e esparsas, arbustos de pequeno porte e vegetação herbácea desenvolvida com muitas gramíneas e ciperáceas (Giulietti et al. 1997).
Os campos rupestres apresentam um alto nível de endemismo e diversidade florística (Giulietti et al. 1997, Mendonça e Lins 2000, Jacobi et al. 2007). Estes campos ocorrem geralmente acima de 900 m de altitude, onde prevalecem rochas de origem quartizítica e canga. Os solos são superficiais, ácidos, pobres em nutrientes e muito drenados (Ribeiro e Fernandes 2000). O clima da região é do tipo mesotérmico (Cwb de Köppen) com as estações seca e chuvosa bem definidas e precipitação anual em torno de 1.500 mm. A estação seca compreende os meses de abril a setembro, enquanto a chuvosa abrange os meses de outubro a março. A temperatura média varia de 17,4 a 19,8°C (INMET 2008).
Coleta de Dados
Os ninhos acompanhados tiveram as observações realizadas a partir de um ponto distante cerca de 5 m, com auxílio de binóculos 8 X 30. O método de amostragem empregado foi adlibitum com registro contínuo (Altman 1974), em períodos de observação de 2-4 h, pela manhã ou tarde, totalizando 32 h de observação. Foi registrado o horário de chegada e saída do ninho, o tempo de permanência dos adultos, o alimento oferecido aos ninhegos, cuidados com a prole e os encontros agonísticos interespecíficos. O sexo dos indivíduos não pôde ser determinado em virtude da ausência de dimorfismo sexual. Os itens alimentares oferecidos aos ninhegos foram identificados visualmente com o auxílio de binóculos quando possível. Na estação reprodutiva de 2005 foram encontrados e monitorados seis ninhos, em intervalos de 1 a 3 dias, sendo registrado o seu status (ativo – construção, incubação e ninhegos ou inativo – abandono, predação ou sucesso), com base em modificações do ninho e seu conteúdo a partir do momento de sua localização. Foram obtidas medidas morfométricas dos ninhos e dos ovos. Também foram anotadas informações sobre período de construção do ninho, incubação dos ovos, permanência dos ninhegos e sucesso reprodutivo por simples percentagem.
Resultados
O período reprodutivo, evidenciado pelo encontro de ninhos, teve início no mês de agosto se estendendo até o mês de dezembro durante as duas estações reprodutivas (Tabela 1). De todos os ninhos que puderam ter sua construção acompanhada (n = 2, um em 2004 e outro em 2005) observou-se uma variação entre 10 e 17 dias.
Os ninhos encontrados em 2004 (n = 2) apresentavam a forma de cesto baixo/forquilha (conforme Simon e Pacheco 2005) e foram construídos sobre Myrsine sp. (Myrsinaceae) e Vochysia thyrsoidea (Vochysiaceae). Os ninhos encontrados em 2005 (n = 6) apresentavam igualmente a forma de cesto baixo/forquilha (conforme Simon e Pacheco 2005) e foram construídos em arbustos de Mimosa calodendron (Mimosaceae), Stachytarpheta glabra (Verbenaceae), Lychnophora sp. (Asteraceae) e três arbustos não identificados. Todos os ninhos encontravam-se em forquilhas horizontais de galhos secundários, permanecendo camuflados com a coloração dos galhos e das folhas. Alguns dos ninhos estavam apoiados pela base (n = 6) e outros pelas laterais (n = 2), a uma altura média de 90 ± 10 cm (n = 6). Os ninhos foram construídos com material vegetal, na maioria ramos secos finos entrelaçados e fixados entre si e nos galhos com teias de aranha. A base da câmara incubatória era preenchida com painas. Os ninhos apresentaram as seguintes dimensões médias (n = 8): diâmetro externo 6,9 ± 0,9 cm, diâmetro interno 5,2 ± 0,1 cm, profundidade 3,5 ± 0,4 cm e altura 4,8 ± 0,7 cm. A postura variou entre um (n = 3) e dois ovos (n = 5), realizado em um intervalo de 3 e 5 dias (n = 2). Os ovos apresentavam um formato ovóide, sendo de coloração creme-clara com pintas marrons e tamanho médio de 19,8 ± 0,8 x 14,6 ± 0,5 mm (n = 9). O período de incubação registrado teve uma duração média de 18,5 ± 0,7 dias (n = 2), e um período de ninhego de 18 ± 1,4 dias (n = 3) até o abandono do ninho.
Para o ninho encontrado em 2004 que teve o cuidado parental acompanhado entre 17 de outubro e 4 de novembro, observou-se que as cascas dos ovos foram removidas.
TABELA 1: Estágio e data de localização de cada ninho monitorado.
Construção
Incubando
Ninhegos
Jovens
Localidade
Ninho 1 25/8/2004
-
-
-
Serra do Cipó
Ninho 2 -
-
17/10/2004
-
P.E. Serra do Rola Moça
Ninho 3 16/8/2005
2/9/2005
-
-
P.E. Serra do Rola Moça
Ninho 4 25/9/2005
27/9/2005
17/10/2005
1/11/2005
P.E. Serra do Rola Moça
Ninho 5 -
13/10/2005
17/10/2005
-
P.E. Serra do Rola Moça
Ninho 6 -
19/10/2005
27/10/2005
14/11/2005
P.E. Serra do Rola Moça
Ninho 7 9/11/2005
11/11/2005
28/11/2005
-
P.E. Serra do Rola Moça
Ninhi 8 -
25/11/2005
5/12/2005
-
P.E. Serra do Rola Moça
Foto: Evando F. Lopes

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